João Nicodemos Martins MANFIO
Nuances: Estudos sobre Educação, Presidente Prudente, v. 34, n. 00, e023012, 2023. e-ISSN: 2236-0441
DOI: https://doi.org/10.32930/nuances.v34i00.10262 13
desinteressada, sem preocupações profissionais, e igual, uniforme em toda
extensão do território” – definiu-o Fernando de Azevedo. [...] Tratando-se de
uma cultura neutra do ponto de vista nacional (mesmo português),
estritamente ligada à cultura européia, na idade Média, e alheia a fronteiras
políticas, - como tinha de ser a cultura difundida por uma ‘associação
essencialmente internacional, com o característico de verdadeira malícia
papalina’ – é certo que essa mesma neutralidade (se nos colocarmos do ponto
de vista qualitativo) nos impede de ver, nessa cultura, nas suas origens e nos
seus produtos, uma cultura especificamente brasileira, uma cultura nacional
ainda em formação (SODRÉ, 1970, p. 12-13).
Perceber a configuração das relações sociais (habitus) no âmbito das instituições,
considerando um modo específico de ser fundamentado em questões relevantes para fins
culturais educacionais, pode representar um caminho frutífero para transformar hábitos
imutáveis em reflexão crítica (instrumentalização, para BOURDIEU; PASSERON, 1975).
Se for considerada a perspectiva descrita por Sodré (1970) pela qual a educação formal
alcança a sociedade, é necessário refletir sobre sua incorporação ao contexto educacional como
um todo, com características que influenciam os eventos históricos. Desse compromisso, não
se espera alcançar verdades absolutas ou imutabilidade, ainda tão presentes nos modelos atuais,
mas, principalmente, a descoberta de características presentes na prática, nas quais as teorias
frequentemente se desviam.
Nesta análise, é relevante situar o tema de estudo em um contexto histórico e considerar
que a sociedade brasileira esteve, até recentemente, sob domínio colonial, formal ou
dissimulado. A colonização deriva diretamente do verbo latino colo (significado: cultivar,
morar). Em latim, significava “eu moro, eu ocupo a terra”, e, por extensão, eu trabalho, eu
cultivo o campo. Um herdeiro antigo do colo é incola, o habitante; outro é inquilinus, aquele
que reside em terra alheia (BOSI, 1992, p. 11). No entanto, o verbo “colo” significa igualmente
tomar conta de cuidar, mandar, querer bem a, proteger. Do supino cultum deriva o particípio
futuro culturus (o que vai trabalhar, cultivar), aplicando-se tanto ao cultivo da terra quanto ao
trabalho de formação humana, acepção em que esse termo latino traduzia o vocábulo grego
Paidéia (SAVIANI, 2008). O que se viu aqui, na verdade, foi o [...]
[...] processo que abarcou de forma articulada, não homogênea ou harmônica,
antes dialeticamente, esse três momentos representados pela colonização
propriamente dita, ou seja, a posse ou exploração da terra subjugando seus
habitantes (os íncolas); a educação enquanto aculturação, isto é, a inculcação
nos colonizados das práticas, técnicas, símbolos e valores próprios dos
colonizadores; e a catequese entendida como a difusão e conversão dos
colonizados à religião dos colonizadores (SAVIANI, 2008, p. 29).